quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

Jornalismo, fotojornalismo e mão mandona

 


Elaine Tavares

Míriam Santini de Abreu

Fiz em 2009 um curso de vídeo oferecido pelo Sinergia, o Sindicato dos Eletricitários, na TV Floripa, e foi graças ao curso que conheci o fotógrafo e documentarista Dario de Almeida Prado Jr. Dario era o nosso oficineiro, e com ele abriu-se uma comporta inesgotável de beleza produzida por fotógrafos e cineastas, cujas referências artísticas e históricas ele compartilhava com arrebatamento.

Houve uma tirada do Dario da qual eu não me esqueço e dela novamente me lembrei quando vi a Rosane Talayer de Lima e o Rubens Lopes de Souza enlaçando a luz para a gravação da entrevista com o repórter Edson Rosa.

Falávamos, na oficina, sobre a necessidade de – por assim dizer – perder o medo da parafernália eletrônica, à qual os profissionais da imagem estão acostumados. Eu não consigo. Aí o Dario veio com essa:— Tem que ter mão mandona! E narrou um trecho do filme “A hora e vez de Augusto Matraga”, de Roberto Santos, baseado na novela de Guimarães Rosa. Há uma cena em que Nhô Augusto é estimulado a mostrar a habilidade de atirar, que deixou de usar há muito tempo. Diz o chefe dos jagunços:

— Não faz conta de bala, amigo. Pode gastar.

— Se eu errar, vocês não reparem, porque faz tempo que eu não puxo dedo em gatilho...

Atira e acerta. E diz o chefe dos jagunços:

— Mão mandona, mano velho. Ferrugem em bom ferro!

Mão mandona... A expressão que Dario usou me encantou, porque me dá prazer observar a forma dos braços e das mãos, a musculatura retesada sob a pele, quando o corpo humano trabalha. E cada pessoa tem mão mandona em algum tipo de trabalho, atividade, profissão, ou em vários, porque tem mão mandona exibida, plural.

Durante uns meses, meu pai dirigiu um caminhão de entregas para completar a aposentadoria, e uma vez ele contou que, numa dessas saídas, conseguiu controlar o veículo e evitar um acidente. Ao olhar em volta para ver se dera tudo certo, outro motorista passou por ele e, num instante, colocou a mão sobre o bíceps, com um sorriso e um sinal de assentimento, e gritou: - Aí tem braço! Agora consigo dar um nome ao que motivou o prazer de meu pai ao contar a história: o deleite da mão mandona, reconhecida nele por outro homem.

Isso está bem expresso na música “Quem Saberia Perder”, de Ivans Lins, disponível em http://www.youtube.com/watch?v=WbxJlHzVKLg&feature=PlayList&p=41C71AFA434071BC&playnext=1&playnext_from=PL&index=19, da qual amo especialmente esse trecho:

Vivo do que faz meu braço

Meu braço faz o que a terra manda

Ah, que tributo à ação!

Num tempo em que a nossa profissão é tornada vil no mercado de trabalho, em que se fala do fim do jornalismo, do fim do fotojornalismo, digo: a maior parte do que se vê nos meios de comunicação não é jornalismo nem fotojornalismo. É outra coisa, tem outro nome, é tema de outro artigo.

Quem faz jornalismo, fotojornalismo, de verdade, sabe muito bem: coisa boa só sai de quem tem mão mandona. E mão mandona no jornalismo — como em qualquer outro trabalho — não é para qualquer um! Ora, ora... que morte, que nada!


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